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Publicado por: Luís Vieira, Engenheiro Eletricista e Agente da Propriedade Industrial
Abril, 16 2020

A função social das patentes em tempos de pandemia



Em tempos atuais, muito se questiona o quanto o sistema de patentes pode ser impeditivo ou favorável ao desenvolvimento e comercialização de tecnologias que atendam às necessidades sociais. Sob um ponto de vista aparentemente negativo frente à concessão de um monopólio de Direito, poderia se pensar que a concessão de uma patente resultaria na coibição de novos desenvolvedores. Já sob um ponto de vista positivo, poderia se pensar que a mesma concessão serviria como contrapartida àqueles que de fato investem, pesquisam, desenvolvem e encontram tecnologias inovadoras.

Voltando um pouco na história, quando nos remetemos ao significado de invenção, logo lembramos de nosso principal inventor e ícone da aviação, Alberto Santos Dumont. Muitos, culturalmente, o correlacionam ao conceito de que ao não patentear uma invenção, o inventor estaria doando-a à sociedade, criando, assim, uma conotação de que a exclusividade sobre uma invenção seria algo ruim para a coletividade.

Sem prejuízo da questão cultural pelo não patenteamento, importa destacar que o Brasil sempre se manteve na vanguarda da proteção à propriedade intelectual, sendo um dos quatro primeiros países a adotarem uma lei a esse respeito, logo no início do século XIX, reconhecendo, assim, que de algum modo o mérito do sistema de patentes.

Atualmente, em tempos de pandemia, a necessidade social de disponibilização imediata de diversas tecnologias que suportem a contenção do Covid-19, como o desenvolvimento de vacinas, kits para testes, equipamentos de proteção individual, maquinários de uso hospitalar, entre outros, trazem à tona diversas questões sobre a correta postura no tocante a patentes correlatas, tais como: “Posso produzir e comercializar prontamente produtos voltados ao combate à pandemia?”; “De que modo as patentes podem me subsidiar a encontrar novas soluções?”; e “Quais as vantagens de se patentear se quero disponibilizar minha inovação à humanidade?”.

Por mais que haja a preocupação social na produção e comercialização de produtos de combate a pandemias, uma vez que o sistema de patentes impede terceiros de produzir e comercializar produtos e/ou processos patenteados sem a autorização de seu titular, certamente uma abordagem mais cuidadosa deve ser tomada, sob o risco de se caracterizar uma infração, sujeitando o infrator às penalidades legais.

A realização de uma ampla pesquisa do que existe sob proteção patentária pode direcionar os novos desenvolvedores a descobrirem o cenário de risco e, por vezes, culminar no encontro de novas soluções técnicas.

Ademais, é importante frisar que a questão de “quebra de patentes” é um mito. O que eventualmente pode ocorrer de fato, é um licenciamento compulsório determinado pelo Estado em ocasiões excepcionais e sob regras específicas, o que não significa que a patente esteja em domínio público e sem vigência e que não haverá remuneração ao titular.

No caso de se encontrar novas soluções técnicas, a decisão de seguir por um patenteamento pode gerar inúmeras vantagens para os titulares, o que, todavia, não necessariamente significa barrar a utilização social da tecnologia desenvolvida, uma vez que a mesma pode ser licenciada pelo titular a qualquer tempo de sua vigência, a qualquer interessado e de modo gratuito ou oneroso, até patamares de retorno financeiro justo.

Possuir uma patente garante que outros concorrentes não venham a reivindicar, posteriormente, a proteção sobre aquilo que já foi desenvolvido (em sistemas first to file), evitando, assim, incertezas sobre eventuais longas e onerosas batalhas jurídicas.

Ter um portfólio de patentes pode garantir a empreendedores um acesso diferenciado e, por vezes, obrigatório a recursos de investimentos e a participações em editais e licitações públicas.

Portanto, investir em inovação e no depósito de patentes, adotando uma postura lúcida e realizando todas as etapas preparatórias para tal, desde uma pesquisa do estado da arte até que se tenha uma expectativa efetiva para a concessão de fato, possibilita que empreendedores tenham segurança jurídica e ampliem suas possibilidades estratégicas no atendimento às necessidades sociais.

Do mesmo modo, uma patente licenciada, sob condições pré-determinadas, pode reafirmar o compromisso social e ser o diferencial que estabelecerá a participação do inventor, da empresa ou de qualquer outra entidade na História, sem que, necessariamente, represente um empecilho à humanidade, sendo, ao contrário, um propagador de inovações.